Lei Rouanet, ao menos R$ 29,4 milhões, foram liberados nos últimos quatro anos, a projetos de empresas ligadas a pessoas que estariam inabilitadas
O governo federal aprovou, via Lei Rouanet, ao menos R$ 29,4 milhões, nos últimos quatro anos, a projetos de empresas ligadas a pessoas que estariam inabilitadas, revela auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU).
O Metrópoles apurou que, desse total, cerca de R$ 4,29 milhões já foram pagos.
Os projetos foram aprovados entre agosto de 2018 (fim do governo Temer) e janeiro de 2021. O maior período no qual foram constatadas potenciais irregularidades, portanto, abrange a gestão do ex-secretário especial de Cultura Mario Frias e do ex-secretário Nacional de Incentivo e Fomento à Cultura André Porciuncula, que se vangloriam na internet de supostamente terem acabado com a “mamata” e irregularidades no setor artístico.
A auditoria da CGU aponta falhas em “todas as áreas e fases” da gestão do Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), nome oficial da Lei Rouanet.
Além de erros na aprovação de projetos, a Secretaria Especial de Cultura, hoje vinculada ao Ministério do Turismo, tem sido ineficiente no processo de recuperação de recursos irregularmente aplicados, avalia a controladoria.
Ao menos R$ 28,785 milhões pagos a projetos culturais que tiveram as contas reprovadas, há dois anos, ainda não foram recuperados. A pasta não tomou providências para o ressarcimento desse valor.
“A ausência de cobrança dos valores aplicados irregularmente nos projetos culturais, além de contrariar a legislação, pode acarretar dano ao erário, tendo em vista a dificuldade de contactar o proponente e de recuperar esses valores após anos da execução do projeto”, explica o órgão fiscalizador.
O relatório de avaliação, ao qual o Metrópoles teve acesso, refere-se ao exercício de 2021 da secretaria.
A Secretaria Especial de Cultura e o Ministério do Turismo foram procurados na tarde de quarta-feira (8/6) para se manifestarem sobre a auditoria, mas não responderam. O espaço segue aberto.
Pessoas inabilitadas
O montante de R$ 29,4 milhões aprovados para projetos de empresas ligadas a pessoas que estariam inabilitadas pode ser ainda mais alto. A CGU citou exemplos para comprovar que o procedimento adotado pela Secretaria de Cultura não é suficiente para impedir que um dirigente de empresa inabilitada tenha novas propostas aprovadas como pessoa física ou como integrante de outra entidade.
A legislação proíbe a destinação de recursos via Lei Rouanet a pessoas físicas ou jurídicas inabilitadas.
O CNPJ do proponente ficará registrado como inabilitado no sistema Salic por três anos.
Na prática, a brecha deixada pelo governo permite, por exemplo, que uma empresa inabilitada use uma filial para seguir obtendo recursos via Lei Rouanet.
“Outrossim, não foram identificados outros testes, mesmo que manuais, a fim de verificar a elegibilidade das pessoas físicas ou jurídicas, quando da avaliação das informações para a obtenção de recursos do Pronac”, afirmou a Controladoria-Geral da União.
Em resposta à CGU, a Secretaria de Cultura relatou que o sistema impede a apresentação de uma nova proposta por empresa ou CNPJ inabilitado. A plataforma, porém, não identifica e, consequentemente, não impossibilita a participação, por exemplo, de uma filial da empresa inabilitada, “uma vez que os algarismos que compõem o CNPJ da filial não correspondem integralmente aos da empresa matriz ou de outra filial”.
A pasta admitiu, ainda, que o Salic não identifica ou reconhece o dirigente de uma empresa inabilitada.
“Caso esse dirigente apresente proposta como pessoa física ou vinculado a outro CNPJ, não haveria impedimento ou crítica efetuada pelo sistema. Apenas o CNPJ é classificado como inabilitado e não as pessoas físicas vinculadas a ele. Nesse caso, qualquer impedimento, se identificado, teria que ser efetuado manualmente”, afirmou a secretaria.
Da redação com Metrópoles