Por Ary Rodrigues: “É a mata que grita, é o mato que cala.”
Nos últimos dias, veicula-se em todos os jornais do país e do mundo, o caso do indigenista brasileiro Bruno Araújo Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips, desaparecidos na Amazônia no dia 5 de junho.
Dom Phillips fazia trabalho voluntário, teve embate com Bolsonaro e sentia ‘amor profundo’ pela Amazônia. O Britânico escrevia para o jornal ‘The Guardian’ e terminava o livro ‘Como salvar a Amazônia?’ Era veterano em coberturas internacionais. Phillips já foi colaborador dos jornais “Washington Post”, “The New York Times” e “Financial Times”, e está no Brasil há aproximadamente 15 anos. Segundo a Polícia Federal, o pescador Amarildo da Costa Oliveira, que foi preso, disse que Dom e Bruno foram assassinados, conforme o G1.
A região Norte, tem sido o palco de violência e impunidade há anos por madeireiros, fazendeiros e grileiros da região. Matam índios, pequenos agricultores, defensores da preservação ambiental e todos aqueles que usam a voz para denunciar os mais variados crimes cometidos por eles. Nos últimos 3 anos, o país retrocedeu 30 anos ou mais, em questões ambientais, políticas econômicas, educacionais e sociais, um verdadeiro caos, digno de show de horror, a cada dia um novo pesadelo.
Na região Norte e centro-oeste, tem se intensificado as barbáries cometidas pelos senhores do agro é tudo, porém é tudo que mata, quando não é de bala é de veneno. Desde natureza a naturalista, matam tudo o que não lhes convém pela frente; matam até o “futuro”, em busca do “progresso”, do progresso da família, em busca da riqueza desacerbada. Pessoas que destroem sem construir, que colhem o que não plantam, são piores que gafanhotos, destruindo lugares, o meio ambiente e pessoas. Se sentem no direito de tirar vidas, sem medo de serem punidos e na maioria não são; têm apoio do chefe da nação, quem denuncia é demitido, quando não é morto; e matar quem denuncia tem se tornado hábito nos últimos anos e é prática incentivada por quem preside esse país, os mortos, motivos de desdém, deboche e pouco caso.
Nesse jogo de xadrez, no qual só pega o peão, quantos hão de morrer por defender a vida? Quantas Margaridas, Chicos, Dorothys, Marielles, Brunos e Phillips hão de morrer por defender a vida? MORRER POR DEFENDER A VIDA! E o que vamos ouvir do chefe da nação sobre tudo isso? Como diz a letra de uma canção de Belchior, Conheço o Meu Lugar:
“Olho de frente a cara do presente e sei
que vou ouvir a mesma história porca”
É a mata que grita, que pede socorro, se ficar morro se correr te mato, se cala.
Talvez um dia possamos saber quem são os perversos personagens, por trás dessa política da morte que rege hoje esse país, quem irá provar esse cotidiano que a história um dia contará? Como é atual a canção de Gonzaguinha, Pequena Memória Para Um Tempo Sem Memória:
Memória de um tempo
Onde lutar por seu direito
É um defeito que mata
São tantas lutas inglórias
São histórias que a história
Qualquer dia contará
De obscuros personagens
As passagens, as coragens
São sementes espalhadas nesse chão
De Juvenais e de Raimundos
Tantos Júlios de Santana
Nessa crença num enorme coração
Dos humilhados e ofendidos
Explorados e oprimidos
Que tentaram encontrar a solução
São cruzes sem nomes, sem corpos, sem datas
Memória de um tempo
Onde lutar por seu direito
É um defeito que mata…
O opressor não seria tão forte se não tivesse cúmplices entre os próprios oprimidos, baseando-me em Simone de Beauvoir, assim afirmo.
Ary Rodrigues
Acadêmico em História – UEPB e Empresário.